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Hand of Fate (Multi) é uma inusitada mistura de RPG, cartas e pancadaria

Hand of Fate traz ideias inteligentes e originais executadas de maneira insatisfatória.

Quando eu era moleque, aproveitava os momentos em que meu irmão mais velho se ausentava para invadir o quarto dele e pegar algumas coisas. Entre meus itens favoritos estavam alguns CDs de Rock, o das Spice Girls, confesso, e, sobretudo, livros-jogos. Para quem não pegou a época, tais exemplares traziam histórias mas eram jogos de RPG ao mesmo tempo. Para cada escolha do jogador, para cada resultado dos dados, a narrativa tomava caminhos diferentes. Isso era feito através de navegação entre as páginas. Jogar Hand of Fate me lembrou muito de como era experimentar esses livros. A sensação é de participar de uma aventura solitária com inspiração nos antigos RPGs. A adição das cartas no jogo ajuda ainda mais a criar essa percepção, pois elas servem como elemento aleatório de navegação na aventura. E aí no meio dessa proposta resolveram enfiar o estilo de batalha da série Arkham. Uma mistura inusitada, de fato.

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Página 2: Eu acredito no coração das cartas

O título é parcialmente parecido com um desses livros-jogos de RPG. A cada vez que você joga, suas escolhas e sua sorte com os dados te levam por um caminho diferente. Hand of Fate acaba guiando o jogador por uma experiência semelhante. É um jogo que te coloca em uma jornada na qual vários eventos aleatórios acontecem ao longo do seu caminho até o chefe do capítulo.

A forma como isso é feito é através das cartas. Existem diferentes tipos delas, mas vamos focar nas cartas de evento. A navegação pelos acontecimentos e missões se dá a partir dessas cartas colocadas na mesa.
Você percorre os caminhos escolhidos até encontrar a saída para a próxima parte ou o chefe do capítulo
O jogador vai escolhendo o caminho, tendo sempre o objetivo de achar a saída para a próxima parte da aventura, e assim sucessivamente até o último “andar” no qual ocorrerá a batalha com o chefe. Cada carta, então, é geradora de um evento. Lojas, calabouços com armadilhas, cavernas com monstros, encontros com outras pessoas, e por aí vai. Em muitos desses momentos o jogador pode escolher o que quer fazer.
Nesse caso escolhi a opção A) que me levou a entrar nas cavernas. O que será que me aguarda lá?
Aí o distribuidor das cartas nos mostra quatro delas (grande sucesso, sucesso, fracasso e grande fracasso) em diferentes proporções dependendo do evento e de seu grau de dificuldade, embaralha-as e faz com que o jogador escolha uma. Na maioria das vezes é difícil acompanhar com os olhos, o que acaba gerando uma situação de pura sorte. O problema desse sistema é que, excetuando-se uma única carta de benção, não existe nada que aumente ou diminua as chances de sucesso. Você não distribui pontos para as habilidades do personagem e os equipamentos não influenciam em nada. Dessa forma a sensação que fica é que estamos muitas vezes a mercê do acaso.

(Poucas) Diferentes Histórias

Essa forma aleatória de conduzir os eventos acaba trazendo possibilidades interessantes para a história. O jogo traz várias missões paralelas que contêm seu próprio ciclo narrativo. Ao vencer certos encontros, ganhamos uma medalha que nos dá a próxima carta referente a tal linha de acontecimentos. Assim, a cada sessão podemos seguir diferentes histórias enquanto procuramos o chefe para liquidá-lo e partir para o próximo.
Para conseguir a carta Labirinto do Minotauro é necessário ganhá-la a partir de outro evento...
É uma forma interessante de criar narrativas distintas para cada jogador, mas é uma forma que tropeça em sua própria execução. Tais eventos são um tanto genéricos e pouco interessantes, ainda que o estilo de escrita seja competente. Falta um cuidado maior com o desenvolvimento das histórias e até mesmo um maior numero de eventos, visto que várias cartas acabam se repetindo muito ao longo da aventura, causando um problema no ritmo da jogabilidade e da narrativa. Fica tudo muito repetitivo.
... e então conseguir enfrentar esta variedade de inimigo pela primeira vez.

Muitas cartas, RPG e uma pitada de… Batman?

Não há nada dentro de Hand of Fate, no entanto, que seja mais repetitivo que sua batalha. Não que seja chato batalhar dentro do jogo, mas a baixa variedade de inimigos aliada ao pouco número de cenários e ao grau de aleatoriedade dos itens que você vai encontrar em cada sessão tornam a experiência um pouco massante. O esquema de batalha é parecido com o da série Arkham: você precisa atacar, contra-atacar no momento certo, quebrar a guarda e desviar. Ao contrário dos jogos do homem-morcego, no entanto, a sensação é de que a batalha de Hand of Fate é seu ponto mais fraco. Problemas com a câmera fixa, falta de exatidão em alguns movimentos e mesmo quedas de framerate quando estamos diante de muitos adversários, acabam colocando o título muito atrás de outros com mecânicas semelhantes, como Shadow of Mordor, por exemplo.

É sacanagem comparar dois jogos com valores de produção e investimento tão diferentes. Mas é, ao mesmo tempo, inevitável. Com um maior número de inimigos e cenários, no entanto, batalhar se tornaria mais interessante, mesmo com os problemas. E um número maior de inimigos e cenários também influiria positivamente na narrativa do jogo. Existem certos arcos de história que te colocam contra inimigos diferentes, e essa é uma parte muito boa. Além disso trazer um frescor à batalha, dá uma sensação de exploração, de que aquele mundo é grande e cheio de desafios. E se todas as cartas trouxessem informações sobre cidades, seres e história daquele mundo, formando um mosaico de mitologia e narrativa (algo que é desenvolvido de maneira impressionante em Dark Souls, por exemplo), Hand of Fate seria ainda mais impactante e divertido.

A gente não quer só comida

A forma como temos de manejar nossos itens e provisões, por exemplo, é bem construída. Cada vez que o jogador se move no “tabuleiro de cartas”, ele gasta uma carta de comida e ganha vida. Sem cartas de comida, o jogador perde vida a cada movimento até o derradeiro momento em que morre por fome. Várias vezes me peguei tendo de vender algum anel, arma ou benção para conseguir comida, até porque o dinheiro é bem escasso em Hand of Fate. Isso acaba trazendo uma sensação de perigo na aventura, de que toda escolha importa, seja escolher para que lado ir, se dá para tentar realizar ou não alguma missão paralela, ou mesmo se vale a pena comprar uma arma melhor ou suprimentos alimentícios.
Ah! Se eu conseguisse uma Thunderstrike em toda sessão!
Falando nos itens, a forma para garantir que eles existam na sessão, assim como os eventos, é que façam parte do deck que você monta antes de iniciar o capítulo. Essa parte de escolher as cartas tanto de equipamentos quanto de eventos, funciona muito bem. Possibilita diferentes formações e estratégias. É outro aspecto que se favoreceria de uma maior diversidade, porém.
Arrebentar esses piratas em 3,2,1...
A maior impressão que tive com Hand of Fate é que tudo nele poderia ter sido melhor trabalhado, que todos os aspectos poderiam ir um pouco mais além. Não me entendam mal, ele já é um título interessante e uma proposta original que tem de ser louvada. Entretanto, todas as suas boas, e, algumas, ótimas ideias acabam perdendo o brilho mediante uma execução não tão empolgante. Um sistema de batalha mais polido (ou até diferente), um maior esmero com o roteiro dos eventos e da história em geral, maior diversidade de inimigos e desafios, alguma possibilidade de influência no grau de dificuldade dos eventos de sorte (a partir de status e habilidades, por exemplo), são mudanças que fariam Hand of Fate não ser apenas um jogo com grandes ideias executadas de maneira insatisfatória, mas sim um título inesquecível mesmo em meio a alguns problemas. Todavia, visto que não é um título caro, não deixo de recomendá-lo pela originalidade e boas ideias.

Prós

  • É um título original;
  • Atmosfera de RPG de mesa;
  • Maneira inteligente de desenvolver e diversificar a narrativa ;
  • Manejar as provisões e itens traz um desafio extra de planejamento;
  • Certos arcos de história paralelos trazem inimigos diferentes e desafiadores.

Contras

  • A batalha é repetitiva e muitas vezes traz problemas no controle do personagem;
  • Ainda que a proposta narrativa seja inteligente, as histórias não cativam;
  • Em certos momentos o caráter aleatório pode frustrar;
  • Falta maior diversidade em diversos aspectos.

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Hand of Fate - PS4/Xbox One/PC - Defiant Development - Nota: 7.0
Versão utilizada para a análise: PS4
Revisão: Luigi Santana
Capa: Diego Migueis

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