Analógico

World of Warcraft: Dez anos de luta, dez anos de conquistas

Em homenagem aos dez anos desse marco na história dos videogames, o GameBlast revisita o MMORPG mais popular do mundo.


Há pouco menos de oito anos, eu joguei pela primeira vez a campanha dos humanos de Warcraft III: Reign of Chaos. Nessa campanha eu controlei Arthas Menethil, paladino e príncipe de Lordaeron, e segui toda a sua trajetória rumo à loucura e à corrupção pelo poder do Lich Rei.


Uma das missões dessa campanha foi O Expurgo de Stratholme — Arthas descobriu que todo o suprimento de comida da cidade de Stratholme estava infectado pela praga do Flagelo dos Mortos-vivos, o que faria com que todos os cidadãos se transformassem em mortos-vivos e se erguessem contra o reino de Lordaeron. O príncipe tomou uma decisão chocante — ordenou que a cidade inteira fosse completamente destruída e que toda a sua população fosse dizimada, antes que se tornassem uma ameaça ao seu reino. Eu controlei o paladino, que até então se mostrara um guerreiro nobre, sábio e honrado, enquanto ele e seus exércitos executavam o genocídio de uma cidade inteira.

Quatro anos depois, eu estava vivendo aventuras neste mesmo universo, mas não era mais Arthas o meu avatar — eu controlava Conflux, o Caçador Troll. As minhas aventuras me levaram ao deserto de Tanaris — mais precisamente nos domínios de Nozdormu, o Aspecto do Tempo e líder dos dragões bronze. Nozdormu me incumbiu de adentrar as Cavernas do Tempo e frustrar os planos da revoada infinita, um grupo de dragões corrompidos que pretendia alterar o passado. Fui alertado de que voltaria no tempo e de que deveria fazer o possível para não modificar em nada os acontecimentos do passado.

Eis que, ao adentrar o portal na minha frente, me vi em uma estalagem à beira da estrada, transformado em um anão por uma magia ilusória dos dragões bronze. Ao seguir a estrada, tive uma surpresa: eu estava na frente da entrada principal da cidade de Stratholme. Na minha frente, Arthas, ainda humano, recebera uma notícia terrível: o suprimento de comida da cidade fora infectado pela praga dos mortos-vivos. Eu, novamente, observei-o ordenar o genocídio dos aldeões. Eu o ajudei a matar os demônios responsáveis pela praga, ao mesmo tempo que exterminava os cidadãos que, pouco a pouco, transformavam-se em mortos-vivos. Mas, dessa vez, eu não era Arthas, o paladino; eu era Conflux, um dos soldados do seu exército.

Eu não estava mais jogando Warcraft III. Eu estava jogando World of Warcraft.

Ao seu lado, meu capitão!

Eu mato dez javalis!

World of Warcraft segue os eventos de Warcraft III, mas oferece uma nova perspectiva: ao invés de controlar um líder ou comandante, você controla um simples aventureiro — um recruta, pouco mais do que um aldeão, e pouco a pouco vai construindo a sua história no universo de Azeroth. É uma mudança ousada. O universo Warcraft é composto de várias figuras marcantes, que poderiam facilmente ser personagens principais de várias histórias; torná-los coadjuvantes e deixar como personagem principal um personagem inexpressivo e sem personalidade poderia ser um tiro no pé se não houvesse muito trabalho por trás para tornar a experiência interessante.

Mas a mudança de paradigma foi extremamente bem trabalhada e acaba sendo muito bem-vinda. O ato de tornar o personagem principal um avatar perfeito faz com que o foco seja a imersão do jogador. Diferente das aventuras anteriores, eu não estou acompanhando a história de um terceiro; eu sou o herói. Eu mato dez javalis. Eu encontro o espião que estava fornecendo informações para a facção alheia. Conforme os eventos se desenrolam, eu me torno o comandante de um posto avançado em um planeta desconhecido; e no fim das contas, eu salvo o mundo. Mais de uma vez.

WoW é a continuação de uma história que já existe, e o título sabe disso e usa esse fato muito bem ao seu favor para aumentar ainda mais a imersão. Lugares que vimos de relance nas instalações anteriores da série agora são reais; podemos visitá-los, explorá-los, conversar com seus cidadãos. Os heróis do passado agora são NPCs com os quais podemos interagir. Eles nos confiam missões e, eventualmente, até mesmo se juntam a nós em um confronto direto.

A expansão do universo de Warcraft para outras mídias — principalmente os livros — também ajuda bastante na imersão de World of Warcraft. Ao ler o livro Crimes de Guerra, me deparei com uma passagem na qual Sylvana Correventos, rainha dos Renegados, lembra-se do momento em que um aventureiro deu a ela um medalhão adornado de safiras. Esbocei um leve sorriso ao ler essa passagem. Eu era o aventureiro. Eu encontrei esse medalhão em posse de um dos fantasmas da Terra Fantasma, e entreguei de volta à sua dona.

Nem robôs gigantes em um cenário de fantasia são capazes de quebrar a imersão!

Viciante? Você decide.

Dez anos se passaram desde o lançamento de World of Warcraft. Muita coisa mudou — o título recebeu cinco expansões, várias mecânicas foram adicionadas e removidas e muita história foi contada desde então. E, depois de tanta mudança, é bem difícil dizer qual é a pedra-chave do jogo. O que torna WoW o sucesso que ele é?

Essa não é uma pergunta que tenha uma resposta definitiva, pois cada jogador tem a sua própria concepção do game. Para mim, World of Warcraft é um épico; sou um caçador que, ao lado do seu fiel lobo, desbrava um universo desconhecido eliminando todas as ameaças à paz do mundo. Para um amigo, que controla um guerreiro orc, é um eterno campo de batalha, em que ele é um dos generais na linha de frente dos confrontos contra outros jogadores da sua facção rival. Outra amiga, que controla uma sacerdotisa elfa, prefere explorar o mundo coletando ervas e desafiando NPCs para batalhas com seus bichos de estimação.

E talvez, ironicamente, o que torna o jogo um sucesso é o fato de que não dá pra dizer o que torna ele um sucesso. É tanta coisa para fazer! Você pode entrar em conflito direto contra outros jogadores. Você pode seguir uma das várias profissões do jogo — coletar ervas, minerar, esfolar feras para adquirir o seu couro, e depois usar esses materiais coletados para produzir armas, armaduras, poções e todo tipo de equipamento. Você pode explorar os mapas e ajudar os NPCs com as mais variadas tarefas que eles te impõem. Você pode cavar em sítios arqueológicos, buscando tesouros escondidos de civilizações antigas. Você pode capturar mascotes e colocá-los para batalhar, em um minigame similar a Pokémon. Tudo isso mesclado organicamente com o universo do jogo, sem nunca se tornar maçante ou chato.

Eu me arrisco até a dizer que é impossível ficar sem coisas para fazer em World of Warcraft. Quando você enjoa de algo, é possível simplesmente achar outros objetivos para cumprir — e em um game que tem um sistema de achievements com mais de 2 mil conquistas para obter, sempre haverá alguma tarefa interessante e divertida a ser cumprida.

Você pode até mesmo ler "Cinquenta Tons de Sombra!"

Justiça para todos

Mas claro que, tratando-se de um MMORPG com level cap (existe um nível máximo a ser alcançado), o foco acaba sendo no endgame — a parte do jogo focada nos jogadores que já alcançaram o nível máximo. Neste ponto, WoW se divide em dois microcosmos: o JxJ (jogador contra jogador), em que você enfrenta outros jogadores em arenas e campos de batalha em um sistema de ranking, que recompensa os participantes que mais se destacam em cada temporada; e o JxA (jogador contra ambiente), que compõe as masmorras e raides — ambientes fechados em que você se junta com amigos para explorar cavernas, cidades, calabouços e florestas, e saquear os poderosos inimigos que lá se encontram.

Por conta da mecânica de equipamentos do jogo — a força do personagem vem quase totalmente do poder dos seus equipamentos, e existem equipamentos separados para os estilos de gameplay JxA e JxE — é difícil fazer ambos ao mesmo tempo de uma maneira competitiva. Por conta disso, os gamers hardcore acabam focando em apenas um modo de jogo, pois são poucos os que têm tempo para cumprir fielmente com os compromissos que o modo hardcore impõe.

Mas aí entra outro ponto em que World of Warcraft se sobressai; e que na minha opinião é o pilar que sustenta a comunidade, e por consequência todo o jogo: o fato de que todos têm oportunidades iguais. Conforme mencionado acima, a força do personagem é ditada pela qualidade de suas armas e armaduras, então o foco do conteúdo endgame acaba se tornando buscar equipamentos melhores. Mas a Blizzard percebeu que isso beneficiaria quem tem muito tempo para se dedicar ao jogo (pejorativamente chamados de players “nolife”). Dessa forma, os desenvolvedores tomaram uma decisão ousada: criaram uma limitação semanal nos equipamentos mais fortes do jogo.

Os jogadores JxJ só podem conquistar 1000 Pontos de Dominação (a moeda que compra equipamentos) por semana, e os jogadores JxA só podem fazer as raides uma vez por semana. Dessa maneira, é possível conquistar esses objetivos da maneira que for mais conveniente para cada um — seja jogando 8 horas sem parar, ou dividindo esses objetivos durante a semana, jogando apenas uma ou duas horas por dia. Independente de como você escolher cumprir os seus objetivos semanais, você nunca vai ficar pra trás. O sistema é justo com todos — cada um se adapta a ele conforme lhe for conveniente.

Conflux, o caçador, montado em seu Frost Wyrm nas Cavernas do Tempo

World of Warcraft hoje

É um excelente momento para começar a jogar (ou até mesmo para voltar a jogar) WoW. O título, que apesar de ter dez anos, foi lançado apenas em 2011 do Brasil, foi totalmente traduzido para o português, e conta com cinco reinos exclusivos para os jogadores brasileiros. O trabalho de localização é fenomenal, resultando em uma das melhores adaptações de um jogo de videogame para o português.

A expansão mais recente, Warlords of Draenor, traz um tema de viagem no tempo, em que os jogadores viajam para uma versão alternativa do passado de Azeroth. Lá, os jogadores vão explorar o planeta de Draenor, construir e gerenciar uma fortaleza e encontrar vários personagens que se tornaram lendas da história da franquia Warcraft. A expansão nova também trouxe modelos 3D atualizados para os personagens antigos, trazendo uma merecida cara nova a um jogo que completa os seus dez anos.

Uma atitude interessante da Blizzard foi conceder um upgrade ao Nível 90 para todos os que comprarem a expansão — como o conteúdo de Warlords of Draenor é projetado para jogadores entre os níveis 90 e 100, esse upgrade garante que mesmo um jogador iniciante possa começar a sua aventura diretamente nesse novo mundo selvagem.

Seja você alguém que nunca jogou WoW, ou um veterano que parou de jogar, agora é uma ótima hora para adentrar o mundo de Azeroth. O começo de expansão é sempre um momento de renovação — o conteúdo é novo e ainda desconhecido pela maioria dos jogadores. É uma boa época para juntar as antigas amizades e fazer novas, e desbravar os ermos de Draenor com eles. Porque, no fim das contas, todo MMORPG é mais divertido quando jogado com os amigos!

Mesmo após dez anos, World of Warcraft continua atual. O jogo traz uma bagagem enorme de erros e acertos decorrentes de todo esse tempo, e por conta disso nunca esteve tão polido e divertido. O que está esperando para deixar a sua marca no mundo de Azeroth?

Vem!


Revisão: Alberto Canen
Capa: Hugo Pereira

Escreve para o GameBlast sob a licença Creative Commons BY-SA 3.0. Você pode usar e compartilhar este conteúdo desde que credite o autor e veículo original.
Este texto não representa a opinião do GameBlast. Somos uma comunidade de gamers aberta às visões e experiências de cada autor. Escrevemos sob a licença Creative Commons BY-SA 3.0 - você pode usar e compartilhar este conteúdo desde que credite o autor e veículo original.


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