Jogamos

Análise: This War of Mine (Multi) e a dura tarefa de sobreviver

Desenvolvido pela 11 bit studios, o título coloca o jogador em um The Sims durante a guerra.


Quando ouvimos falar sobre jogos de guerra, logo pensamos em franquias famosas como Call of Duty e Battlefield, que colocam o jogador na pele de soldados com a missão de eliminar todos os inimigos em cenas de ação e muito sangue. Fugindo um pouco dessa linha, This War of Mine resolveu focar na sobrevivência de civis, dentro de casas abandonadas e estabelecimentos destruídos. Lançado para os computadores no final de 2014, ele finalmente chegoupara os sistemas iOS e Android em julho deste ano.


Antes de mais nada, é importante avisar que esse não é um jogo para celulares. Devido ao grande número de informações na tela, fica difícil de entender o que está ocorrendo ou até mesmo controlar as ações em aparelhos menores, deixando-o praticamente exclusivo para tablet.

Os primeiros passos

A tela inicial do jogo já mostra um pouco da tristeza que ele carrega: você pode abandonar os personagens e tentar novamente com outros.

Após uma pequena apresentação, que nos diz um pouco sobre a guerra e a difícil missão de sobreviver enquanto ela ocorre, o jogador é obrigado a escolher entre dois grupos de três pessoas. Em poucos segundos, o jogo é iniciado, sem tutoriais ou qualquer tipo de ajuda. A tela é curiosamente familiar: durante a E3 2015 tivemos a oportunidade de jogar Sheltered (XBO/PC), um título que trata da sobrevivência em um espaço pós-apocalíptico e que será lançado ainda este ano. Ambos têm jogabilidade parecida.

A tela do jogo é simples, com símbolos indicando todas as ações que podem ser feitas. É possível ver toda a residência onde os personagens se encontram, dividida por paredes e portas, com poucos móveis. Não há grande segredo para que controlemos tudo: basta tocar no rosto de quem deseja movimentar e, em seguida, onde quer que ele/ela vá. No início é comum que nos sintamos perdidos, já que não sabemos por onde começar e quais as consequências de nossas ações, o que poderia ser considerado ruim (o que não é o caso, felizmente).
No início é difícil entender o que cada um dos símbolos na tela representa, sendo necessário experimentá-los várias vezes.

É interessante que pensemos em This War of Mine como uma enorme metáfora. Imaginemos que uma guerra realmente ocorra, destruindo nossa casa e nos obrigando a viver com desconhecidos. Não há comida, o frio se aproxima e não há segurança. Por onde começar? É dessa maneira que encontramos na falta de tutoriais a beleza do jogo.

Após alguns minutos analisando o local, percebemos a grande quantidade de atividades que podemos (e precisamos) fazer. Antes de mais nada, é preciso limpar os quartos dos entulhos e buscar por peças e materiais que possamos usar para construir outros aparelhos, como fogões, cadeiras, camas e aquecedores. Obviamente, o dia termina de maneira rápida, nos obrigando a dormir e descansar para o dia seguinte. É então que entramos em um outro modo de jogo: a exploração.
Conforme os dias no jogo vão passando, novas áreas ficam acessíveis, com mais itens e inimigos.

Dentre os personagens, podemos escolher um para explorar outros locais do mapa em busca de itens que auxiliem na nossa sobrevivência, deixando os outros para trás — eles podem dormir ou ficar de vigia, tentando impedir a invasão de outras pessoas. Alguns destinos estão disponíveis, com alguns detalhes em texto do que pode ser encontrado por lá, inclusive possíveis pessoas armadas. É preciso pensar bem para evitar que alguém mate o seu personagem.

Nada é de ninguém

Supermercados foram invadidos por mendigos. Condomínios abandonados são saqueados, enquanto a igreja foi dominada por ladrões. A sociedade está um caos, e fazer parte dela não é fácil. Em nossa aventura, com medo de não sobrevivermos à primeira noite, resolvemos invadir uma casa onde apenas um casal de idosos vivia. Foi tudo fácil e recompensador: encontramos muita comida e remédios, levando tudo de volta para o nosso lar em nossa mochila.
Ao coletar objetos e itens, é importante pensar no espaço que irão ocupar. Alguns personagens conseguem carregar um pouco mais, mas, no geral, todos têm em torno de 10 espaços livres em bolsas e mochilas. Por conta disso é necessário dar prioridades e deixar o que não for utilizado imediatamente.
Ao retornar, descobrimos que tentaram invadir enquanto nosso personagem estava fora. Alguns itens haviam sido levados, e as outras pessoas foram machucadas; logo, toda a comida e remédios que havia trazido haviam sido consumidos. Mas o pior estava por vir: a depressão.

This War of Mine vai além de simplesmente sobreviver com comida e teto. Suas ações geram consequências emocionais aos personagens, fazendo com que reajam de diferentes maneiras (o que geralmente implica em mais problemas). No nosso caso, todos entraram em depressão por termos roubado itens de um casal de idosos, fazendo com que interrompessem suas atividades para sentar no chão e lamentar. Várias horas de trabalho foram perdidas fazendo com que todos conversassem entre si, tentando afastar a tristeza.
Quase todas as noites há tentativas de ataque, sendo necessário criar armas para proteção. É comum que os personagens acabem feridos.

Depois de alguns dias de sobrevivência, outros problemas começam a aparecer. Personagens começam a ficar doentes por conta do frio, nos obrigando a construir aquecedores e coletar madeira para queimar. É preciso criar facas e roubar armas para sobreviver às invasões, além de tê-las como precaução em explorações. Alguns reclamarão por não lerem livros, outros por não fumarem há dias. Parece impossível que a morte não ocorra.

Um jogo triste

Após o vigésimo dia (no tempo do jogo) em que conseguimos manter a equipe viva, poucas coisas nos trouxeram felicidade e positividade. Um dos nossos personagens morreu ao receber tiros durante um roubo, e as pessoas que integraram a equipe estavam doentes. A fome pareceu ser um grande empecilho, já que todos os lugares que visitávamos estavam sem alimentos. Caçar era uma opção, mas era preciso esperar entre dois e três dias para que conseguíssemos algo.
É comum que pessoas apareçam em sua casa pedindo para morar junto, sendo que muitos estão com fome e machucados.

Não apenas por conta do tema e da maneira como é abordado, This War of Mine faz de tudo para que nos sintamos desmotivados a continuar tentando — assim como os personagens. A trilha sonora lembra muito o estilo da utilizada em The Last of Us (PS3/PS4), com melodias tristes e lentas. O visual tem pouquíssimas cores, sendo difícil enxergar detalhes e sentir outras emoções. As próprias falas nos fazem querer desistir de tudo, com frases como “não há esperança” surgindo a cada momento.

Ainda assim, criamos um laço com o jogo. É muito fácil que entendamos a humanidade trazida pelos desenvolvedores na evolução dos personagens, que passam a ter tristeza em torno de tudo e deixam de se preocupar com a morte dos que não conhecem. Infelizmente, quase todas as pessoas que controlávamos morreram de fome e frio após 29 dias, tornando impossível que saibamos o que ocorreria depois. Não é preciso dizer que não há a opção de tentar novamente: ao morrer, o jogo acaba e é preciso começar com outros personagens.
Quanto mais tempo o jogador conseguir sobreviver, mais personagens irá abrir. Cada um carrega habilidades específicas, como ser bom de brigas ou cozinhando bem.

É quase óbvio que digamos um clichê, mas que não deixa de ser verdadeiro: na guerra não há vencedores. E isso é fácil de perceber em apenas minutos com This War of Mine. Na versão analisada, porém, há alguns problemas devido ao grande número de informações na tela, mesmo em tablets.

Em momentos de ação, em que é preciso apertar rapidamente em direções específicas, o comando não reage tão bem. Isso fez com que um de nossos personagens andasse ao invés de correr, sendo alvo de diversos tiros (e morresse). As falas enquanto as pessoas conversam aparecem sobre itens do cenário, tornando difícil a sua visualização e interação, causando alguns minutos de tentativas frustradas apertando com o dedo no mesmo lugar. Algumas informações são difíceis de serem lidas, deixando a impressão de que foram feitas para funcionar em telas maiores apenas.
A parte mais divertida (e difícil) do jogo é a invasão. É preciso ficar atento, já que entrar em batalhas é perigoso, valendo mais a pena roubar as coisas sem ser notado.

Nenhum dos problemas citados, porém, acaba com a experiência. This War of Mine chega para trazer um ar diferente em meio ao mercado atual, nos mostrando um outro lado das guerras que é extremamente difícil de entender. É constante a sensação de frustração enquanto jogamos, desmotivando o jogador a tentar novamente, mas a esperança de encontrarmos um final feliz nos faz começar tudo de novo. Este é um jogo que ensina muito, mostrando que nem sempre precisamos de temas alegres para criar entretenimento.

Prós

  • Visual e sons bonitos e condizentes com o tema;
  • Sistema inteligente de administração e gerenciamento;
  • Ações que geram reações imprevisíveis;
  • Traz a sensação de estar do outro lado da guerra;
  • História montada pelas atitudes do jogador.

Contras

  • Mesmo em tablets, as telas carregam informações demais;
  • Toques imprecisos em momentos de tensão;
  • A sensação de perda desestimula a jogar novamente.
This War of Mine — Multi — Nota: 8.0
Versão utilizada para análise: Android
Revisão: Alberto Canen
Capa: Ana Rocha

Escreve para o GameBlast sob a licença Creative Commons BY-SA 3.0. Você pode usar e compartilhar este conteúdo desde que credite o autor e veículo original.
Este texto não representa a opinião do GameBlast. Somos uma comunidade de gamers aberta às visões e experiências de cada autor. Escrevemos sob a licença Creative Commons BY-SA 3.0 - você pode usar e compartilhar este conteúdo desde que credite o autor e veículo original.


Disqus
Facebook
Google